Saudades de usar máscara

Dentro do possível, e em que pese as dificuldades sanitárias e a existência de diversas ondas da doença no mundo, estou muito contente de ver que o estado pandêmico de Covid-19 melhorou consideravelmente: com as campanhas de vacinação; fim dos lockdowns; redução de medidas restritivas; com o decreto de fim da emergência de saúde pública internacional, pela Organização Mundial da Saúde (OMS) etc. Em certa medida, a desobrigatoriedade do uso de máscara em várias ocasiões representa essa melhora. Contudo, ainda que contente pela possibilidade de não usá-la em determinadas situações, como em encontros agradáveis e em momentos de lazer, já sinto saudades de usá-la em outras.

Dias atrás, eu comentava com minha irmã mais nova sobre isso. Ela, que concorda comigo, apresentou um motivo que eu não tinha pensado: o uso de máscara disfarça até a ausência de maquiagem, o que é motivo relevante para muitos. Dizia a mim que, às vezes, não há vontade ou tempo de maquiar-se, embora goste de estar produzida.

Chegamos à conclusão de que existem outros bons motivos para o uso de máscara, além da sua finalidade precípua, é claro, a qual sintetizamos como proteção da saúde individual e coletiva. Ajuda a não sermos reconhecidos naquelas situações nas quais queremos passar despercebidos, quando avistamos alguém em momento inoportuno, por exemplo; disfarça nossas reações inconvenientes, como um sorriso irônico de canto de boca; mitiga o constrangimento de cumprimentos desagradáveis, naquelas situações em que a necessidade de bons modos protocolares prevalece em detrimento da enorme vontade de ser severo e sincero; protege-nos de outras inúmeras doenças — eu mesmo mal lembrava da última vez que peguei gripe; entre outros tantos possíveis motivos.

Às vezes, é ruim. Quase sempre tem aquela figura que parece ter cheirado pó, que funga e espirra de propósito, ou aquele nariz de palhaço, que finge espirrar para fazer graça. Além dos que costumam agir assim quando veem alguém usando máscara, também é possível encontrar diferentes motivos para não quererem usá-la: dificuldade para respirar, inclusive, porque existem modelos improvisados, feitos de chita a retalhos de jeans; engano, quando vermos que pessoas são diferentes do que imaginávamos, o que torna rostinhos encobertos, no mínimo, de beleza duvidosa; dificuldade para paquerar, pois cara tampada desestimula até um mero cumprimento com beijo no rosto; esquecimento na hora de comer, ao se tentar a proeza de atravessar o tecido levando o garfo à boca.

Mas pior do que tudo isso é esquecer a máscara, e aí ficar desprotegido e não poder entrar em determinados locais. Sim, ainda existem locais com restrições, especialmente por conta da higiene. Mesmo assim, há quem use máscara como lenço, seja quando o nariz escorre, o buço fica suado ou a maquiagem derrete.

Aleatoriamente, vi uma publicação no Instagram que defendia o uso de máscara para bloquear odores desagradáveis, não necessariamente de humanos, mas da poluição urbana em geral — se bem que alguns suportam o próprio bafo de penico. Curiosamente, o post também defendia o uso para aliviar o frio nas narinas — talvez levando em conta a massa de ar polar que se espalhava pelo Brasil.

Salvo exceções, a obrigatoriedade do uso de máscara sumiu — acho que até porque a maioria sequer cumpria/cumpre esse dever. Todavia, saudades de usá-la já surgiram. Ainda bem que o uso é facultativo.


por Maicon Melito, especializando em direito tributário pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FDRP/USP)

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